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24 de Abril de 2024

Punir e expiar e a alteração na Lei Maria da Penha pela Lei nº 13.827/2019

Publicado por Felipe Gabriel Guerra
há 5 anos

Na história do pais, infelizmente, há uma crescente iniciativa em matérias penais, como se pode observar a da excelente leitura do livro Populismo Penal Legislativo a tragédia que não assusta as sociedades de massas, dos autores Luiz Flávio Gomes e Luís Wanderley Gazoto. Neste raciocínio, o objetivo desta é mostrar os riscos e as consequências, de forma preliminar a Lei nº 13.827/2019 pode causa na comunidade jurídica e da sociedade em geral em relação a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha).

Pobre Brasil tupiniquim, cujo legislador mais uma vez optou pela política do encarceramento ao criar no artigo 12-C, § 2º, uma vedação a liberdade provisória legal, nos casos em que haja risco a integridade física da ofendida, ou à efetividade da medida protetiva de urgência em relação a ofendida na Lei Maria da Penha.

É expresso, e somos sabedores que, em regra, compete a União legislar sobre matéria processual penal, artigo 22, inciso I da CF, e que as decisões em controle de constitucionalidade não vinculam o legislador, evitando-se o fenômeno da “fossilização da constituição”.

Contudo, o STF ao longo dos últimos anos vem diluindo a violação a separação dos poderes e a individualização da pena pelos legisladores, como, exemplificativamente, foram o julgamento a vedação a fiança no Estatuto do Desarmamento (ADIn 3.112-1 STF), a progressão de regime nos crimes Hediondos (HC 82959, STF), a fixação do regime inicial de cumprimento de pena diverso do fechado, também em sede de crimes Hediondos (HC 111840, STF). E, agora, uma vedação a liberdade provisória. É grave, o que é isso?

A medida protetiva a mulher por Delegados de Polícia e Policiais, na ausência de Juízes constituí uma medida temerária, perigosa, geradora de insegurança jurídica, e que viola conforme mencionado alhures a separação e a independência dos poderes.

O exposto acima não é desqualificar a natureza jurídica e Policial do Delegado de Polícia, cuja relevância já mencionamos em diversas oportunidades. E, a qual defendemos que pode e deve realizar o Auto de Prisão em Flagrante Delito e o Inquérito Policial por vídeoconferência e através de Inquéritos Policiais eletrônicos, alcançado cidades, Distritos e os diversos rincões deste país, e com contato direto com vítimas, testemunhas e suspeitos, a qual receberia representações e petições através das tecnologias disponíveis.

Mas, de modo a exemplificar, o perigo da alteração legislativa, aqui trabalhada, mencionamos diversas cidades nos entes federativos que ainda são desprovidas de Delegacia de Polícia, e que não sede de comarca, mas que possuem policiais militares. Indaga-se seria possível a imposição de uma medida protetiva por policial militar, com fundamento no artigo 12 – C, § 3º da Lei Maria da Penha? Essa indagação decorre, devido à ausência de técnica legislativa dos parlamentares que se refere a policial não especificando o órgão constitucional a que pertence, e ainda traz a terminologia denúncia ao invés de representação, como já ocorre no artigo 12, inciso I da Lei nº 11.340/2006 e artigo § 4º do CPP. "En passant" é preciso mencionar que o artigo 308 do CPP, é norma anterior, geral e de mesma hierarquia que a Lei n. 13.827/2019 no artigo 12 - C, parágrafo terceiro, inciso, III, assim quis o legislador teleologicamente que no caso de medidas protetivas de urgência, policiais militares, rodoviários federais, em tese, não seriam obrigados a diligenciar a delegacia de polícia judiciária mais próximo para fins de efetivação das medidas protetivas de urgência.

A inquietação acima não visa desmerecer as funções desempenhadas pelos Militares Estaduais, mas apenas seu desligamento de sua função constitucional de policiamento ostensivo e preservação da ordem pública. A atividade de Polícia Judiciária que não seja a militar, acreditamos ser inconstitucional, e não se pode a qualquer pretexto se afastar de nossa Lei maior.

Logo, a proibição da liberdade provisória não é uma prisão preventiva, pois não se submete aos requisitos do artigo 312 e 313 do CPP, não é uma prisão em flagrante, pré-processual e sob o controle do Judiciário, resta, portanto, denominarmos a vedação a liberdade provisória uma prisão cautelar sui generis, desmedida e desproporcional.

Acreditamos ser desnecessário o julgamento histórico, ressalvada algumas críticas da ADIn 4.424/DF, STF, Plenário, julgado em 17/02/2012 sobre a constitucionalidade de normas da Lei Maria da Penha. A violência doméstica e familiar contra a mulher, desejamos que sejam efetivadas políticas públicas educadoras, realmente preventivas devido à natureza socioeconômico/político/educacional das políticas públicas.

A Lei nº 13.827/2019 fere a separação dos poderes, de fato, e cria uma medida prisional processual anômala que nem mesmo nos crimes de bens jurídicos de transindividuais e coletivos são permitidos.

A violência contra a mulher sempre existiu, tal fato é retratado no livro da Angela Davis, a qual extraímos um pequeno trecho:

“E histórias sobre ataques de policiais a mulheres negras – vítimas de estupro que, às vezes sofrem um segundo estupro – são ouvidas com muita frequência para ser descartadas como anormais. Mesmo quando o movimento pelos direitos civis de Birmingham estava mais forte, por exemplo, jovens ativistas frequentemente afirmavam que nada poderia proteger as mulheres negras de serem estupradas pela polícia de Birmingham. Recentemente, em dezembro de 1974, em Chicago, uma jovem negra de dezessete anos relatou ter sido estuprada por dez policiais. Alguns dos homens foram suspensos, mas no final todo o caso foi varrido para fora do tapete” (Davis, Angela. Mulheres, raça e classe; tradução Heci Regina Candiani – 1º ed. São Paulo: Boitempo, 2016, pág.178)

Acreditamos que a cifra negra vem diminuindo devido ao acesso a informação, e ao empoderamento feminino que torna as diversas formas de violências de conhecimento do público, ávido pela punição, a qual deve ser certa, mas respeitada a constituição federal e os tratados internacionais em que o Brasil é signatário.

No livro Controle Externo da Atividade Policial pelo Ministério Público o autor Rodrigo Régnier Chemim Guimarães com franqueza e fundamento expõe o seguinte pensamento:

“Como a investigação, de regra, se inicia junto a polícia, acaba sendo esta que decide se realmente investigará, ou não, determinado caso, ao passo que o Ministério Público e o Judiciário somente tomarão conhecimento do fato criminoso, se a polícia assim o entender. Ou seja, na atual estrutura de Justiça Criminal Brasileira, tanto o Ministério Público quanto o judiciário acabam trabalhando somente naquilo que interessa a polícia. No mesmo sentido, o alerta de Ela Wiecko V. de Castilho: Na prática é a transformação da Polícia em dominus litis. Sim, porque de nada serve ao MP ter o monopólio da ação penal pública, se quem decide o quê, como e quando deve ser objeto de ação penal e Polícia ” (Guimarães, Rodrigo Régner Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público.– 2º ed. Curitiba: Juruá, 2012, pág.83)

Por fim, sugerimos que a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar não se diminuí com o veneno amargo da vedação a liberdade provisória, mas com o remédio da educação e de políticas públicas efetivas, humanizadas, promotoras de acesso a mulher a sua liberdade de pensar, agir e se autodeterminar, realizar suas escolhas sobre seu corpo, sua família, orientação sexual, profissão, dentre outras com independência, e tudo alicerçado pela educação e igualdade de direitos entre homens e mulheres no seio da sociedade como base da sociedade.

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9 Comentários

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Interessante... Vai ficar mais fácil usar o truque nas Varas de Família para auferir vantagens patrimoniais e, claro, nas disputas de guarda de menores. continuar lendo

Será mais fácil agora abusar da Lei para chantagear. Com a conivência de um policial então se pode destruir a vida de um inocente com a maior facilidade. Mas tudo bem, porque quando se abusa contra homem tudo bem, são cidadãos de segunda classe mesmo. continuar lendo

Vejam bem tenho uma filha de22 e outra de 21 tenho 24 de união nunca sequer levantei a mão para elas seria incapaz de encostar sequer um dedo nem na minha esposa nem nas filhas .por algumas descrições por por motivos banais de ambas as partes ela decidiu se separar mas eu muito apaixonado pela mesma tentei mudar a decisão dela. .. ela foi a delegacia deram a ela uma medida protetiva baseada na lei Maria da Penha .no mesmo dia foi uma oficial de justiça até minha casa me onde tinha uma história de vida o
Onde estava minha maior riqueza .minha esposa e filhas .essa oficial mandou que eu pegasse somente minhas roupas e saísse de lá não podendo mais lá voltar mantendo distância de 300 metros ......
A mesma pessoa quem aplicou a lei ela não deveria ter me ouvido antes . Que tipo de lei é essa .ou será que ele aplicou essa lei dessa maneira porque minha esposa estava acompanhada de uma vereadora que nem sabe oque se passava dentro do meu lar. ..eu acho que tem muitas pessoas despreparadas para aplicarem a lei .ou a lei é muito injusta com muitos .,..por favor se alguém do meio puder me esplicar por favor des de já agradeço continuar lendo

José Roberto, para o deferimento das medidas protetivas de urgência, não é preciso ser ouvida a outra parte (no caso, o suposto agressor), basta ser comprovado no registro de ocorrência o fumus boni iures e periculum in mora (perigo da demora).
Se o suposto agressor, obrigado ao cumprimento da medida se inconformar com o deferimento da mesma, basta que procure a defensoria pública ou advogado para requerer a revogação das medidas com os devidos fundamentos. Nos Juizados de Violência Doméstica, é dado prioridade as petições com este cunho. continuar lendo

Ora senhores. Vejam a ótica equivocada exarada em um livro sobre o assunto: "“Como a investigação, de regra, se inicia junto a polícia, acaba sendo esta que decide se realmente investigará, ou não, determinado caso, ao passo que o Ministério Público e o Judiciário somente tomarão conhecimento do fato criminoso, se a polícia assim o entender. Ou seja, na atual estrutura de Justiça Criminal Brasileira, tanto o Ministério Público quanto o judiciário acabam trabalhando somente naquilo que interessa a polícia".
A investigação é iniciada na Polícia porquanto a CF e o CPP assim determinam. O Delegado, autoridade de Polícia Judiciária tem a capacidade plena de saber distinguir o Certo do Errado, O justo do Injusto, O moral do Imoral e o Legal do Ilegal, a mesma, portanto de um magistrado e a dos fiscais da lei que são os membros do MP (promotores). Logo, onde podemos justificar que tal autoridade tenha que ser "monitorada" por um agente ao qual não existe nenhuma subordinação efetiva funcional. Quem não deveria executar nenhuma investigação seria justamente o promotor de Justiça, porquanto se ele vai denunciar ou pronunciar um criminoso, como então justificar, a luz do Direito, quer ele investigue e denuncie o investigado. São coisas que em pleno século XXI ainda vemos no Brasil. Ademais, se houver algum risco de benesses ao criminoso pela autoridade processante, o delegado, como alguns insinuam, o mesmo risco pode ser alcançado se a investigação for feita por outro agente público.
Imaginemos o Delegado investigando e ele mesmo denunciando o criminoso. Trata-se de algo fora de qualquer parâmetro aceito pela sociedade brasileira. O vício, a desonra e as ilegalidades são práticas vistas em qualquer segmento das atividades públicas, não sendo, portanto, exclusividade da instituição policial, aliás, esta tem sido, como noticiado na mídia brasileira, uma das poucas que expulsam e colocam na cadeia, com suas próprias investigações, portanto isentas e não condescendentes, seus maus funcionários, ao invés de transferi-los ou os forçarem a pedir aposentadoria. Realmente, a polícia não pode ser a dominus litis, como comentado na obra aduzida, pois cabe tão somente ao Delegado o livre arbítrio de indiciar ou não o culpado, baseado nas provas materiais e testemunhais encontradas por ele, que ao final, apresentará Relatório conclusivo ao Juiz, que abrirá vistas ao MP, não cabendo assim, no espírito da lei vigente, nenhuma subordinação senão ao seu juízo profissional. O controle externo da atividade policial, como bem definido (externo) não é senão algo que já existia desde tempos pretéritos nas atividades independente da autoridade policial e da promotoria pública, o que se traduz então como uma garantia para o ser humano a quem está sendo imputado qualquer acusação criminosa, ou seja: aquela autoridade que o investigará, certamente jamais vai ser aquela que o acusará, pois isso, em acontecendo, violaria o princípio constitucional vigente, tanto do contraditório quanto da ampla defesa.
Parabenizamos o autor pelo bom trabalho publicado, concordando, em parte com a sua ótica experiente, pois a exemplo do exarado "desejamos que sejam efetivadas políticas públicas educadoras, realmente preventivas devido à natureza socioeconômico/político/educacional das políticas públicas", achamos ser esta a solução para a erradicação da violência contra a mulher, as leis ajudam mas não resolvem a situação delas no país.
A lei nova, é temerária porquanto não podemos nem devemos, atribuir poderes a quem não está processualmente autorizado, em razão das leis vigentes, a privar a liberdade de outrem, ainda que fosse merecedor.
A modificação, acabará beneficiando o acusado, pois não acreditamos que um magistrado, se consultado, venha negar a liberdade do criminoso, mantido preso, ainda que por medida cautelar,por um policial civil ou militar, "fantasiado" de autoridade processante.
Com tantos recursos via internet, com um pouco mais de inteligência, tanto um juiz de plantão quanto um Delegado, poderia ser consultados sobre o tema e definir o destino do criminoso.
O Brasil tem pecado pela falta de imaginação e criatividade, e quase sempre, o bandido acaba sendo o grande beneficiado. continuar lendo

Só lembrando que a imposição inicial da medida protetiva, seja ela pelo delegado ou pela polícia, está sujeita ao crivo do magistrado em até 24 horas, conforme a nova Lei. Desta forma, não há que se falar em violação continuar lendo